Por Alisson, PR7GA
Uma forma simples de entender o que é uma PORTADORA é analisando a nossa voz. Quando abrimos nossa boca e falamos, estamos emitindo uma PORTADORA! São os sons que emitimos que são gerados em nossa garganta. Quando esses sons são inteligíveis, estamos transmitindo INFORMAÇÃO: as palavras.
NOTA: Este artigo é uma reedição ligeiramente modificada de outros artigos já publicados pelo QTC da ECRA há alguns anos.
Quantos de nós nos referimos às faixas de radiodifusão comercial como sendo “a faixa de AM” ou “a faixa de FM”? Mas você sabia que AM e FM são apenas MODOS de transmissão, e que além destes, existem outros inúmeros como SSB, CW, RTTY, PSK31, JT65, FT8? Mas o que seria um MODO de transmissão?
PORTADORA E MODULAÇÃO
Antes de tratar deste assunto, precisamos entender algo mais fundamental. O conceito de PORTADORA e MODULAÇÃO.
Muitos conhecem a palavra PORTADORA e a associam a algo muito ruim: a interferência que certos desocupados geram nas repetidoras, tentando tumultuar os contatos. Então, seguindo este mau exemplo, associam a PORTADORA a algo mau, mas no entando a PORTADORA é importantíssima. Aliás, não haveria radiocomunicação sem ela, juntamente com a MODULAÇÃO!
Então, se os sons são a PORTADORA, as palavras que falamos e “transmitimos” são a MODULAÇÃO! Enquanto falamos com nossos amigos, eles estão captando a nossa voz (a PORTADORA) e entendendo as palavras que estamos emitindo (a MODULAÇÃO), e assim, conseguimos nos comunicar. Ou seja, em resumo, PORTADORA é algo que CARREGA, TRANSPORTA, LEVA uma informação, ou seja, a MODULAÇÃO.
MODOS DE TRANSMISSÃO - AS "LINGUAGENS" DO RÁDIO
Vamos entender agora o que são MODOS DE TRANSMISSÃO com outra analogia. Para se comunicarem, nossos antepassados inventaram inúmeras línguas ao redor do mundo. Então, aqui no Brasil falamos a língua portuguesa, na China se fala o Mandarim, na França o francês, nos Estados Unidos o inglês, e assim por diante. Obviamente, para que possamos nos comunicar com outras pessoas, precisamos todos falar a mesma língua.
Se a nossa voz é a PORTADORA e as palavras que falamos são a MODULAÇÃO, então a língua que falamos é o MODO DE TRANSMISSÃO. Ou seja, é a FORMA como a informação é transmitida. Eu posso dizer BOM DIA em português, OHAYO em japonês, GOOD MORNING em inglês, BUENOS DIAS em espanhol, mas em todos esses casos a INFORMAÇÃO foi a mesma. O que mudou foi a FORMA de transmitir essa informação, essa ideia de cumprimentar.
Então, quando falamos em AM, FM, SSB, CW, RTTY, DSTAR, FT8, estamos falando em algo como línguas diferentes, todas destinadas a transmitir informação.
MODOS ANALÓGICOS
CW
O primeiro modo de transmissão a ser inventado foi o CW, no século 19. CW significa “onda contínua” na abreviação em inglês, e quando associado ao código morse, consiste de sons curtos e longos que, em conjunto, significam letras, números, pontuação e sinais especiais. Assim, um único som curto significa a letra E, dois sons curtos a letra I, um som longo a letra T, um som longo e três curtos a letra B, e assim por diante.
Apesar de ser o mais antigo modo de transmissão, o CW ainda hoje é utilizado por inúmeras pessoas, dentre elas, nós os radioamadores. Isso acontece porque o CW é uma das formas mais eficientes de comunicação. É possível montar um transceptor de CW de baixa potência com apenas alguns reais e mesmo assim fazer contato com outros radioamadores distantes até milhares de quilômetros, dependendo da faixa utilizada e da propagação.
Além disso, O CW até hoje é utilizado pela telemetrias (Beacon) dos satélites no banco de dados do SatNOGS. Não é mesmo interessante. (https://db.satnogs.org/stats/) [informação adicionada pelo Paulo PV8DX]
AM
Depois do CW, o segundo modo de transmissão inventado foi o AM, que significa “amplitude modulada”. Para gerar uma transmissão em AM, basicamente a PORTADORA varia sua potência, ou amplitude, em função do áudio a ser transmitido. Foi o primeiro modo que permitiu transmitir diretamente a voz humana, permitindo a quem transmite ser ouvido em qualquer lugar aonde chegue sua transmissão. Porém, em comparação ao CW, seu alcance com a mesma potência é bem menor, ou seja, é bem menos eficiente.
Um receptor AM é extremamente fácil de montar.
Veja acima, por exemplo, o chamado rádio de Galena ou rádio a cristal: consiste basicamente numa bobina, um diodo, um resistor e um capacitor, sem necessidade de alimentação com energia elétrica. No início do século 20, nossos avós e bisavós sintonizavam as emissoras de radiodifusão da época utilizando a princípio estes receptores simples. No radioamadorismo, este modo de transmissão ainda hoje é utilizado por saudosistas especialmente nas faixas de 40m e 80m.
SSB
Para resolver o problema da baixa eficiência do AM, foi desenvolvido o modo chamado SSB, abreviatura em inglês para BANDA LATERAL SINGELA. Nos rádios, o SSB se divide em dois modos, chamados USB e LSB. Em comparação com o AM, este modo apresenta uma qualidade de áudio nitidamente inferior, e não serve para transmitir música, apenas a voz humana. Apesar disso, teve adoção generalizada ao redor do mundo pela sua eficiência: este modo de transmissão consegue ir muito mais longe que o AM, com a mesma potência.
Comparativamente, uma transmissão em AM precisa ter uma potência seis vezes maior que em SSB para chegar com a mesma intensidade que este! Por exemplo, se um transmissor SSB de 100W consegue chegar, em determinada banda, numa distância de 1000 km, em AM seria necessário aumentar a potência para 600W para poder chegar com o mesmo nível de sinal que a transmissão em SSB. Em termos de eficiência energética, é uma diferença e tanto!
Porém, o SSB tem uma pequena desvantagem. Para que possamos entender uma transmissão em SSB, temos que sintonizar EXATAMENTE na mesma frequência que o sinal transmitido, com tolerância de apenas algumas dezenas de Hertz. Do contrário, o áudio recebido ficará completamente ininteligível, com voz de “pato” ou parecendo um monstro falando! Assim, enquanto que um transceptor AM é relativamente simples de construir, um transceptor SSB é extremamente complexo, e portanto, bem mais caro.
MODOS DIGITAIS
RTTY
O RTTY é a transmissão, via rádio, de TTY, ou seja, de teletipo, conhecido também como teleimpressora. Este modo de transmissão pode ser considerado como uma das aplicações mais antigas da tecnologia binária em telecomunicações, logo depois de Código Morse.
Foi inventado ainda no século 19, e foi utilizado pela primeira vez em rádio pelas forças armadas dos Estados Unidos nos anos de 1920, e comercialmente em 1932. Consistia de máquinas impressoras que emitiam sinais de áudio, consistindo de 5 bits de informação, que eram transmitidos via rádio para outras máquinas, que imprimiam o texto recebido. Estes sinais permitiam transmitir texto muito mais rapidamente do que via código morse, e assim, preferível quando era preciso enviar grandes quantidades de informação em pouco tempo.
Dentro do radioamadorismo, o uso do RTTY iniciou-se logo após o fim da II Guerra Mundial, em VHF. Já em 1946, aconteceu o primeiro contato radioamadorístico via RTTY na faixa de 2m. Hoje em dia, as faixas de HF são as preferidas para operação, e são realizados contestes em todo o mundo reunindo seus praticantes.
Uma antiga máquina de RTTY
PSK31
Seguindo a evolução da tecnologia, temos o PSK31. Este modo de transmissão é largamente usado especialmente nas bandas de HF pelas vantagens em relação ao RTTY. Enquanto que este modo sofre bastante com o QRM e QSB, o PSK31 oferece um sistema de correção de erros que minimiza esses efeitos sobre a recepção, tornando o texto recebido muito mais livre de erros. Além disso, ao contrário do RTTY que só oferece a transmissão dos caracteres alfabéticos, numéricos e alguns sinais de pontuação, o PSK31 oferece a possibilidade de envio de todos os caracteres do código ASCII, incluindo sinais especiais.
Outra grande vantagem do PSK31 é sua largura de banda, apenas 60Hz, contra cerca de 340Hz do RTTY e 3KHz da fonia em SSB. Quanto menor a largura de banda necessária, mais o modo de transmissão é eficiente, pois pode chegar “mais longe” com menos potência.
JT65 e FT8
Estes modos, especialmente o FT8, são considerados a “coqueluche” do momento. Inúmeros colegas têm utilizado estes modos em seus contatos pelo incrível poder de completar QSOs com níveis de sinal baixo, completamente inaudível para os ouvidos humanos.
Isto se deve à forma como os sinais são codificados. Somando-se isto ao período do Ciclo Solar em que nos encontramos, que prejudica a propagação dos sinais via ionosfera e praticamente inviabiliza a utilização de certas bandas e contatos a longa distância, podemos entender como estes modos têm sido preferidos entre tantos colegas.
Como falamos, estes modos permitem contatos com níveis de sinais baixíssimos, impossíveis de serem conseguidos utilizando outros modos. Isto é conseguido tornando a velocidade de transmissão extremamente lenta, além da pequena quantidade de informação transmitida. Como os dados são transmitidos de forma devagar, isso permite ao receptor separar mais eficientemente o que é ruído do que é o sinal propriamente dito, e isso é aliado à pequena quantidade de caracteres transmitidos, somente 13, o que permite enviar apenas o indicativo de ambas as estações e a reportagem de sinal, o que é considerado a mínima troca de informações que torna um contato válido.
Em ambos os modos de transmissão, JT65 e FT8, todas as estações obedecem a um ciclo sincronizado de transmissão e recepção. Cada estação obrigatoriamente deve sincronizar o relógio de seu computador com precisão de décimos de segundo, pois caso contrário, o computador não conseguirá decodificar os sinais. Em JT65, cada ciclo dura precisamente 1 minuto, e em FT8, apenas 15 segundos.
DIGITAL VOICE - DMR, C4FM, D'STAR
Por último, em nosso panorama sobre os modos digitais, temos os modos DV. Os modos de Digital Voice, ou voz digital, são modos que utilizam modulação digital para a transmissão de voz, além de dados como mensagens de teto, coordenadas geográficas para localização, etc. Têm se tornado bastante populares nos últimos anos.
O primeiro deles a chegar no mercado foi o D'STAR, desenvolvido pela ICOM em conjunto com radioamadores japoneses. A Yaesu também lançou seu sistema, chamado "FUSION" e também conhecido pelas siglas C4FM e YSF. Por fim, a Motorola lançou o DMR, sistema que vem rapidamente ganhando popularidade e é atualmente o mais utilizado pelos radioamadores a nível mundial.
Basicamente, o rádio codifica a voz em um sinal digital que é então transmitido pela antena. Do outro lado, outro rádio faz o caminho inverso, recebendo o sinal e decodificando a voz transmitida. Como vantagem está a maior clareza e a ausência de ruídos no áudio transmitido. O alcance tende a também ser maior, já que o sinal transmitido inclui códigos de correção de erro, o que aumenta a possibilidade do sinal ser decodificado mesmo quando está bem fraco.
Outra vantagem dos modos de Digital Voice é a possibilidade de utilização da internet como meio de transporte do sinal, expandindo as possibilidades de utilização do rádio. Atualmente a rede DMR/Brandmeister é a que mais tem usuários no mundo. Esta rede permite a criação de "salas" para conversação, chamadas de TG "talk Groups", onde colegas podem se reunir em torno de um tema específico (comunicação de emergência, bate-papo técnico, etc) ou por região (estados brasileiros, países, etc).
Este uso da internet é pouco compreendido por alguns, que julgam que os modos Digital Voice dependem da internet pra funcionar, o que não é verdade. A Internet é apenas um complemento útil. Sem internet, os rádios e repetidoras vão funcionar da mesma forma que os analógicos funcionariam, só que com vantagens.
OUTROS MODOS COMUNS
Além dos modos analógicos e digitais que citamos acima, existem inúmeros outros, como SSTV, que é transmissão de imagens, ATV, que é transmissão de vídeo, similar à transmissão de TV analógica comum – sim, como radioamadores nós podemos ter uma estação transmitindo TV! – e transmissão de DADOS. Muitos não sabem, mas parte da faixa de frequências utilizada pelos roteadores WIFI é compartilhada com uma faixa de radioamadores. Isso permite a nós também entrarmos no mundo das transmissões de dados, como Internet.
Há uma pesquisa interessantíssima nesse campo por parte de colegas lá fora para permitir interligar pontos distantes e prover comunicação de dados, inclusive de internet, inclusive em situações de emergência. Como podemos operar na faixa destinada ao WIFI, alguns colegas conseguiram com sucesso modificar alguns roteadores de internet de forma que possam operar de forma autônoma, criando pontos que se interligam de forma automática e provendo uma infraestrutura de rede bastante robusta e quase imune a quedas. Este é um campo novo, mas que pode ser explorado por qualquer colega radioamador que se interesse pelo assunto, de qualquer classe.
Dito desta forma, parece que estes modos são inacessíveis, complicados de operar e trabalhosos, mas isto não é verdade. Após as configurações iniciais, qualquer um pode operar em modos digitais sem esforço algum, e com possibilidades de contatos a longa distância incríveis.
Imagine transmitir com apenas 30 W, com uma simples antena dipolo ou vertical, e seu sinal ser ouvido a dezenas de milhares de quilômetros, do outro lado da Terra! Isto tornou estes modos extremamente populares entre os colegas ao redor do mundo, e serve também de porta de entrada para o incrível mundo dos contatos DX, pois não requer grandes antenas ou grandes potências, apenas persistência e uma pitada de sorte.
NOTA: Este artigo é uma reedição ligeiramente modificada de outros artigos já publicados pelo QTC da ECRA há alguns anos.
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Mais um tema bem explicado amigo Alisson. Parabéns!
ResponderExcluirComo você comenta sobre o mais antigo modo ....Criado no século 19...O CW até hoje é mais utilizado pela telemetrias dos satélites no banco de dados do SatNOGS.
Não é mesmo interessante. (https://db.satnogs.org/stats/)
73 de Paulo PV8DX
Excelente texto, Alisson. Parabens!
ResponderExcluirMaravilhoso artigo.. Parabéns ...
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