Por Alisson, PR7GA

Temos visto em várias faixas populares entre os radioamadores a disseminação de certos comportamentos, os quais além de ilegais e anti-éticos, ainda são profundamente desmotivadores. 

Definitivamente, o radioamadorismo é uma mescla de hobby e serviço, conforme explicamos no artigo Para que serve o Radioamadorismo? Uma reflexão sobre o que é ser Radioamador que publicamos dias atrás.

Porém, sem perder este alvo de vista, é óbvio que os radioamadores não falam APENAS de assuntos técnicos nas faixas. É natural a conversa descontraída em assuntos diversos, porém tendo em mente a natureza pública do meio de comunicação, o que significa que o rádio não deve ser utilizado da mesma forma como um telefone ou grupo de whatsapp onde as conversas normalmente não são propagadas para fora daquele ambiente. 

Mas como definir a linha divisória entre o que é bom e o que deve ser evitado?

Do ponto de vista legal, temos uma excelente baliza na forma do Art. 35 da Res. 449/2006, que diz:

"Art. 35. Ao radioamador é vedado desvirtuar a natureza do serviço, assim como usar de palavras obscenas e ofensivas, não condizentes com a ética que deve nortear todos os seus comunicados."


Desvirtuar a natureza do serviço


Segundo o famoso Dicionário Caldas Aulete, em sua versão digital, 
o significado da palavra "desvirtuar" é: 1. Dar má interpretação a; DETURPAR; 2. Desviar(-se), adulterar(-se); 3. Depreciar ou tirar a virtude ou o merecimento de; DESPRESTIGIAR.

A deturpação pode ser voluntária ou involuntária, mas sempre se manifesta por falta de entendimento sobre o que é de fato o Serviço Radioamador. Discorremos sobre isto longamente no artigo Para que serve o Radioamadorismo? Uma reflexão sobre o que é ser Radioamador.

Ou seja, utilizar as faixas de Radioamador para realizar qualquer coisa que "deturpe" ou "desprestigie" o Radioamadorismo é infração ao que diz o Art. 35 da Res. 449!

Deturpar


O que seria, então, deturpação? Alguns exemplos de condutas vedadas nas faixas de radioamador:

1. Tratar de assuntos comerciais, ainda que se trate de artigos ligados ao hobby como equipamentos para a estação ou serviços, ou realizar quaisquer operações pecuniárias, ainda que não visem lucro;

2. Promover ou depreciar ideologias políticas, religiosas ou filosóficas;

3. Utilizar o radioamadorismo como "Cavalo de Tróia" para fazer coisas proibidos dentro do Serviço. Este tipo de desvirtuação tem se tornado comum no mundo dos satélites radioamadores, pois empresas inescrupulosas têm tentado lançar satélites com objetivos diversos, muitas vezes comerciais, mas disfarçados de radioamadorismo. Exemplo: Um satélite que realiza mapeamento da superfície terrestre mas que é dotado de um simplório beacon ou transponder para ser licenciado como satélite radioamador e gozar das facilidades regulatórias restritas a este serviço (ou seja, é muito mais barato para lançar!);

4. Instalar uma repetidora e restringir seu acesso a determinado grupo, impedindo o uso legal e ordeiro dos demais radioamadores;

5. Entregar a operação da sua estação a pessoas não habilitadas sem sua supervisão;

6. Denegrir a reputação de pessoas ou empresas, sob qualquer pretexto;

Evidentemente existe um sem-número de possíveis condutas vedadas aos radioamadores quando utilizando as faixas para se comunicarem e seria impossível listá-las todas. Porém, conforme mencionamos mais acima, o fato de alguém procurar compreender o que o radioamadorismo é já é um excelente caminho para evitar cair nestas práticas daninhas.

Desprestigiar


Outra palavra que é sinônimo de "desvirtuar" é desprestigiar. Aí, a coisa fica mais séria.

Qualquer Radioamador que se preze quer que o hobby/serviço cresça e que seja cada vez mais popular. Mas será que temos dado uma boa impressão às pessoas de fora, especialmente os jovens?

Conta-se que um jovem radioamador, querendo mostrar seu transceptor recém adquirido e instalado, reuniu sua família para uma pequena demonstração. Rádio ligado, antena acoplada, logo encontrou uma frequência aonde uma conversa acontecia. Sintonizou, pegou o microfone e... Cadê o espaço de câmbio? Eles falavam tão rápido e sem dar espaço que o jovem radioamador não conseguia entrar. Ele então se desculpou com os familiares e, já meio constrangido, foi procurar outra frequência. Logo encontrou. Desta vez havia espaço de câmbio, porém ficou ruborizado quando ouviu o linguajar e os temas da conversa: futebol, política e... mulheres. Nesse momento a esposa já o olhava meio "torto". Rapidamente mudou de frequência, envergonhado. Finalmente achou uma terceira frequência aonde os colegas pareciam mais civilizados. Logo pediu oportunidade e pôde alegremente falar no rádio e fazer a tão esperada demonstração à sua família. Ao devolver a palavra, porém, ficou estupefato quando alguém na rodada falou que tinha acabado de trazer um rádio dos EUA, estava na caixa, era moderníssimo, uma pechincha, e perguntou se queria comprar, inclusive aceitava até cartão... Naquele momento, o jovem radioamador desistiu da demonstração ao perceber que sua família já queria fazer um abaixo-assinado para ele vender tudo e deixar "esse negócio de rádio, que é para gente sem noção"... QRT!

A história é fictícia, mas será que estaria muito distante da nossa realidade hoje?


Ao ligar nossos rádios nos 40 metros ou alguma repetidora de VHF, será que aquilo que ouviríamos não nos traria algum tipo de constrangimento caso estivesse ao nosso lado nossa esposa, nossos filhos, nossos pais, nossos amigos ou qualquer outra pessoa "de fora"?

"Ah, mas eu sou Radiomador! Tenho meu COER e minha licença e posso falar o que quiser!"

Nem tudo. A partir do momento em que algo que eu digo pode trazer desprestígio para o Serviço, ainda que não seja explicitamente proibido em norma, eu estou no mínimo causando dano à imagem do Radioamadorismo.

Rádio não é telefone ou aplicativo


Devemos nos lembrar que o rádio é um sistema de comunicação aberto! Esta é uma das principais diferenças para um telefone ou uma conversa via whatsapp, onde podemos falar o que quisermos, pois estamos protegidos pelo caráter fechado dessas tecnologias. Há inclusive uma proibição explícita nas normas vigentes para que seja empregada qualquer tecnologia de criptografia, de forma que os nossos comunicados sempre possam ser ouvidos e entendidos por qualquer pessoa.

Por estar sempre aberto, devemos sempre "vigiar nossa boca" de forma que nunca jamais saia dela algo que venha a nos envergonhar, seja perante os demais radioamadores, seja diante da sociedade. Afinal de contas, devemos atrair as pessoas, nunca espantá-las, não é?

Veja a política, por exemplo. Imagine se fôssemos discutir nas nossas sofridas faixas quem vota em A ou B, quem é de direita ou esquerda, de cima ou de baixo? Desentendimentos no rádio frequentemente levam a atitudes autodestrutivas e até covardes como interferir deliberadamente com portadoras e interferências, além do desrespeito, palavras chulas e bagunça. Isso é radioamadorismo?

"Quer dizer que não posso falar do meu candidato (ou meter o cacete no candidato dos outros)?" Não pode, pois radioamadorismo é APOLÍTICO (não toma partido)! Assuntos polêmicos que levem à polarizações e desentendimentos  devem ser evitados com rigor.

Certa vez me deparei com uma rodada aonde os participantes estavam cantando. Desafinados, alegremente soltavam suas gargantas dando voz às suas músicas preferidas, um após outro. Alguém poderia com muita propriedade dizer que mais parecia uma mesa de bar regada a "água que passarinho não bebe", e com razão. 

"Quer dizer que não posso cantar?" Não pode, pois no mínimo está trazendo má fama para o hobby!!

O foco é: se alguém estivesse me ouvindo agora, qual seria a impressão que teria a respeito do Radioamadorismo de acordo com o que estou dizendo?


Foi com esse intuito que criamos a imagem seguinte e a disseminamos como uma campanha:




Uma das questões que compõe a prova de Ética e Técnica Operacionais lança luz definitiva e é com ela que encerramos esta reflexão:





Viva o radioamadorismo ético e ordeiro!



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