Por Alisson, PR7GA

Como todo radioamador que opera nas bandas de HF está cansado de saber, neste momento, em agosto de 2020, estamos no ponto de menor atividade solar, razão pela qual a propagação parece que "morreu". Sim, parece, mas não morreu não. Mas isto é tema para outro artigo!

Há 117 anos, o Sol estava neste mesmo patamar de atividade: baixíssima. Na época, o rádio era algo misterioso e restrito a poucos "malucos" que decidiram explorar suas possibilidades, como nosso patrono Roberto Landell de Moura. Assim, ninguém reclamava de propagação ruim. Porém, mesmo em meio à calmaria do astro maior, quem estava vivo na época presenciou um fenômeno incomum, incrível e assustador. 

Sem aviso, uma tempestade solar rompeu a tranquilidade e causou transtornos aqui na Terra, ao contrário do que se poderia esperar de um período de "dormência" do Sol. Um estudo publicado na edição de 1º de julho do Astrophysical Journal Letters mostra o que aconteceu. Clique aqui para baixar o estudo.

Segundo os principais autores do estudo, Hisashi Hayakawa (Universidade de Nagoya, Japão) e Paulo Ribeiro (Universidade de Coimbra, Portugal), no final de outubro de 1903, uma das tempestades solares mais fortes da história moderna atingiu a Terra. Ela ocorreu num momento bem parecido com o que estamos agora - logo após o período mínimo de um ciclo solar fraco.

A linha vermelha mostra quando a tempestade aconteceu, justamente no período de atividade mínima

Os autores chegaram a esta conclusão após analisar registros feitos na época por vários observatórios geomagnéticos - lugares aonde o campo magnético terrestre é monitorado. Nestes e em todo o mundo, as agulhas pularam freneticamente para fora da escala em meio ao distúrbio, mostrando a força da tempestade vinda do Sol.

Usando dados registrados em quatro destes observatórios, eles calcularam o tamanho da tempestade. Ela ocupa o sexto lugar no ranking das maiores tempestades geomagnéticas conhecidas desde 1850, logo atrás da grande tempestade de março de 1989, que causou um apagão em toda a província de Quebec, no Canadá.

Ainda segundo o estudo, durante a última semana de outubro de 1903, uma mancha solar razoavelmente grande que revelava o início de um novo ciclo apareceu. Estava diretamente voltada para a Terra em 30 de outubro quando desencadeou uma explosão solar. Apesar de não poder ser quantificada pois não haviam meios para isso na época, deve ter sido muito forte; minutos após a explosão, o campo magnético da Terra oscilou fortemente quando a radiação causou fortes correntes elétricas que fluíram na atmosfera superior do nosso planeta.

Porém, o maior impacto ainda estava por vir. 27,5 horas depois, uma enorme nuvem de plasma atingiu o campo magnético da Terra. Novamente as agulhas dos observatórios enlouqueceram, mas isto foi o mínimo. A forte variação no campo magnético induziu fortíssimas correntes nos condutores de linhas elétricas e telegráficas em todo mundo, interrompendo as comunicações. Em Chicago, nos EUA as tensões nas linhas telefônicas chegaram a 675 volts - "o suficiente para matar um homem", de acordo com as manchetes da época no Chicago Sunday Tribune. Os telegrafistas em Londres não conseguiam enviar mensagens para a América Latina, França, Itália, Espanha, Portugal e Argélia.

Enquanto isso, no céu as auroras se espalharam pelos dois hemisférios. No hemisfério sul, as belas luzes foram vistas até em Nova Gales do Sul, na Austrália, enquanto no norte chegaram além do Colorado nos Estados Unidos. Testemunhas oculares disseram a um jornal do Colorado que “raios de luz se estenderam até acima de suas cabeças, dando a impressão de que algum terrível incêndio estava ocorrendo em algum lugar ao norte da cidade”.

Os pontos vermelhos mostram aonde as auroras foram avistadas durante a tempestade de outubro a novembro de 1903.

E qual o nível real desta tempestade solar? Pesquisadores do clima espacial classificam tempestades usando um índice chamado "Dst " (Disturbance storm time), uma medida da atividade geomagnética que pode ser estimada a partir de antigos registros de magnetogramas. Para a tempestade de 1903. Hayakawa e colegas encontraram um valor de Dst = -531 nT. Para comparação, a grande tempestades de 1859, chamada de "Evento Carrington" e a Grande Tempestade Ferroviária de maio de 1921 estão ambos no nível de Dst = -900 nT. Assim, isso coloca a tempestade de 1903 bem próxima das maiores tempestades da história.

À medida que 2020 vai passando, o sol está começando a sair de um período de Mínimo Solar e novas manchas solares do novo ciclo vêm sendo registradas. Fiquemos atentos!

Fonte: https://spaceweatherarchive.com/2020/07/29/the-solar-minimum-superstorm-of-1903/



Receba em primeira mão as notícias publicadas no QTC da ECRA!

Se você usa Whatsapp, acesse ZAP.ECRA.CLUB
Se você usa Telegram, acesse TELEGRAM.ECRA.CLUB
Ou siga o QTC da ECRA no Twitter: TWITTER.COM/QTCECRA

Deixe seu comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem